Estudantes do Colégio Estadual Felisbelo Freire, de Itaporanga d’Ajuda, que estão há 15 dias em greve, fizeram ato na Secretaria de Estado da Educação (SEED) nesta terça-feira, 19, para mais uma vez dizer não a medida autoritária da SEED, que deseja a qualquer custo transformar a unidade de ensino em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral. Além dos estudantes, professores, que são membros do Conselho Escolar do Colégio Estadual Felisbelo Freire, também marcaram presença no ato.
Os estudantes e os professores foram recebidos pelo secretário em exercício da SEED, José Everton Siqueira Santos. A coordenadora geral do Núcleo Gestor de Ensino em Tempo Integral, da SEED, Francis Alves, também participou da conversa.
Os estudantes colocaram os motivos pelos quais estão, desde o dia 4 de dezembro, em greve e pediram aos representantes da SEED que abram o canal de diálogo e respeitem a decisão da comunidade escolar, que não quer que o Colégio Estadual Felisbelo Freire seja transformado em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral.
“Muitas pessoas que trabalham pelo dia e estudam à noite não poderão mais estudar porque as escolas menores que existem em Itaporanga são do 6º ao 9º ano e uma outra escola que tem ensino médio só possui seis salas. Para onde vão todos os alunos que terão de deixar o Felisbelo Freire? Além disso, o nosso colégio tem uma estrutura física muito ruim que não oferece qualquer condição digna para ficarmos lá o dia inteiro. Tudo que queremos é que o Governador do Estado e a SEED escutem a nossa voz, escutem a comunidade escolar do Felisbelo Freire: Nós não queremos este modelo de tempo integral”, enfatiza o estudantes do 2º ano, do ensino médio, João Paulo.
O modelo imposto pela SEED é sim excludente
Em uma tentativa de ludibriar e deslegitimar os argumentos colocados pelos estudantes e professores, a coordenadora geral do Núcleo Gestor de Ensino em Tempo Integral, da SEED, Francis Alves, afirmou que a adesão do Colégio Estadual Felisbelo Freire, ao Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), e sua consequente transformação em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral, em nada alteraria o regime de funcionamento do Colégio. Francis Alves disse que o ensino fundamental seria mantido, bem como o ensino noturno.
No entanto, a portaria do Ministério da Educação (MEC), nº 727, de junho de 2017, que estabelece novas diretrizes, novos parâmetros e critérios para o Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), é muito clara ao afirmar, em seu artigo 12, parágrafo 8º, a obrigatoriedade do fim do ensino fundamental, da Educação de Jovens e Adultos (EJA) e o ensino noturno nas unidades de ensino que aderirem ao EMTI.
Art. 12 – No plano de trabalho referido no inciso II do art. 11, a SEE [Secretaria de Estado da Educação] deverá:
§ 8º – No caso de, ao iniciar sua participação, a escola atender os anos finais do ensino fundamental, ao ensino noturno ou à educação de jovens e adultos – EJA, o plano de trabalho apresentado pela SEE deverá prever uma estrutura de gestão dedicada ESPECIFICAMENTE ao EMTI, visando a conversão COMPLETA do estabelecimento ao ensino médio em tempo integral no final de três anos de implementação.
Isso significa dizer que os estudantes trabalhadores, que buscam o ensino noturno para conciliar estudo e emprego; crianças e adolescente do 6º ano ao 9º ano do ensino fundamental e jovens que ajudam seus familiares no turno oposto ao da escola serão todos excluídos das unidades de ensino que aderirem ao Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), ao final de seu terceiro ano de implantação.
Situação no Felisbelo Freire
Em agosto de 2017 representantes SEED estiveram no Colégio Estadual Felisbelo Freire para se reunir com o Conselho Escolar da unidade de ensino e convencer o mesmo a transformar o Colégio em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral.
Nesta reunião não estavam presentes todos os seguimentos que compõem o conselho escolar, os conselheiros não tiveram acesso à portaria 727, do Ministério da Educação, para de fato entender o que ocorreria a unidade de ensino caso aderisse ao Programa de Fomento às Escolas de Ensino Médio em Tempo Integral (EMTI), e o mais grave: em nenhum momento houve qualquer estudo, debate ou consulta para saber da comunidade escolar se o modelo de tempo integral capitaneado pela Secretaria de Estado da Educação contemplava seus anseios e demandas.
Ignorando qualquer aspecto democrático, a SEED conseguiu com que os poucos representantes do Conselho Escolar ali presentes assinassem o documento que autorizava a transformação do Colégio Estadual Felisbelo Freire em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral.
Mas rapidamente a comunidade escolar se mobilizou, e mostrou aos Conselheiros, que praticamente votaram as cegas, o quão a adesão ao modelo de tempo integral imposto pela SEED seria prejudicial à unidade de ensino, por se tratar de uma modelo excludente, que coloca de lado estudantes do ensino fundamental, estudantes trabalhadores, estudantes que moram em povoadas ou bairros distantes da Colégio e professores.
Após uma amplo debate, que envolveu a comunidade escolar, os maioria dos conselheiros que votaram a favor da transformação do Felisbelo Freire em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral, mudaram de ideia. Como isso, foi construído um outro documento que revogava a primeira decisão do Conselho Escolar.
Mas a SEED ignorou a voz da comunidade escolar, ignorou a voz dos conselheiros e manteve o Colégio Estadual Felisbelo Freire, na lista de unidades de ensino que serão transformadas em Centros Experimentais Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral, no ano de 2018.
“Desde agosto estamos nesta luta, fizemos diversos atos em Itaporanga para chamar a atenção da população e para pedir posicionamento da SEED, mas não obtivemos uma resposta. Levamos o caso ao Ministério Público Estadual, que tinha uma audiência marcada conosco no dia 6 de dezembro, mas a audiência foi adiada e remarcaram para o final de janeiro. Diante de um cenário tão instável, cheio de incertezas e, sobretudo, desta falta de diálogo por parte da SEED, os estudantes decidiram paralisar suas atividade”, relata a professora e conselheira Escolar do Colégio Estadual Felisbelo Freire, Fabiana Paiva.
A professora conta ainda que o Conselho Escolar e seus conselheiros, que são contra a transformação da unidade de ensino em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral e apoiam a mobilização dos estudantes, estão sendo constantemente pressionados. “Há muita pressão por parte da SEED e por parte de nossa Diretoria Regional de Educação, DRE 08. O conselho está sendo ameaçado ser processado por apoiar a greve dos estudantes”, coloca a professora Fabiana Paiva.
O SINTESE foi convidado por estudantes e conselheiros a se fazer presente no ato desta terça-feira, 19. O Sindicato se colocou a disposição e tem dado suporte aos estudantes e professores. Para a diretora do departamento de base estadual do SINTESE, professora Claudia Oliveira, a SEED tem repetido um padrão de comportamento que envolve manobras escusas, falta de diálogo e imposição.
“O que temos visto em todo o estado é uma repetição de comportamento por parte da SEED: eles chegam às escolas fazem reuniões a toque de caixa; na grande parte destas reuniões não há representação de todos os segmentos que fazem parte da comunidade escolar; a comunidade escolar não é ouvida; não há qualquer estudo sobre os impactos da transformação daquela unidade de ensino em Centro Experimental de Ensino Médio em Tempo Integral, ou seja, os problemas são gravíssimos. É necessário que se ouça os anseios da comunidade escolar e que a mesma esteja esclarecida. Compreendemos que a vontade da comunidade escolar é soberana e deve ser respeitada”, afirma a diretora do SINTESE.