“Tudo que temos feito é esperar. Esperar que o prefeito Lila Fraga pague o nosso salário. Esperar pela justiça. Esperar que desembargadores sejam favoráveis a nós. Esperar que conselheiros do Tribunal de Conta de Sergipe façam valer a Lei. Não estamos esperando de braços cruzados, pelo contrário, estamos nas ruas, ocupando espaço e denunciando a sociedade a nossa triste realidade. No entanto, nesta luta e nesta espera estamos há 78 dias sem receber salário”, narra com tristeza o membro da comissão de negociação do SINTESE em Lagarto, professor Benizário Júnior.
Isso mesmo, desde o mês de agosto que os professores da rede municipal de Lagarto estão sem receber um real de seus salários, totalizando 78 dias de angústia e espera.
A esperança de mudar esta dura realidade era através do julgamento, que ocorreria nesta quarta-feira, 19, no Tribunal de Justiça de Sergipe (TJ), do mandado de segurança impetrado pelo SINTESE, contra a prefeitura de Lagarto, requerendo que o prefeito Lila Fraga fosse obrigado a cumprir com o que estabelece a lei e pagar em dia os salários dos professores.
Mas o sentimento de esperança logo deu lugar à tristeza e ao silêncio. O relator do processo, o desembargador Cezário Siqueira Neto, está de licença, com isso os desembargadores não puderam julgar o mandado de segurança. Provavelmente, o julgamento só voltará a entrar em pauta no TJ daqui a duas semanas.
“Entendemos o fato do relator está licenciado. No entanto, é muito difícil para nós voltarmos para casa da mesma forma que chegamos aqui: sem nada assegurado. Muitos de nossos companheiros estão passando por dificuldades financeiras de todas as ordens. Alguns só estão se alimentando porque o SINTESE está dando cesta alimento. Estamos vendo nossa dignidade e de nossa família ir por água abaixo e nada está sendo feito pela justiça para mudar esta realidade. Nós trabalhamos e temos o direito de receber. Salário não é favor, é direito. Até quando este crime contra os professores continuará sem que nada seja feito? Precisamos pagar nossas contas, precisamos comer, precisamos ter nossa dignidade retomada”, cobra a coordenadora da subsede do SINTESE na região Centro Sul e professora em Lagarto, Isa Cristina Oliveira.
Após todo o ocorrido, ainda em frente ao Tribunal de Justiça de Sergipe, os professores de Lagarto deliberaram realizar uma assembleia da categoria, no próximo dia 01 de novembro, para encaminhar ações de luta e possível indicativo de greve.
Ministério Público
O prefeito de Lagarto, Lila Fraga, firmou acordo com o Ministério Público no qual se compromete a pagar o mês de outubro no próximo dia 30 e iniciar o pagamento dos salários atrasados no dia 10 de novembro. Este acordo foi firmado entre a prefeitura de Lagarto e o Ministério Público sem a participação ou consulta ao SINTESE e aos professores do município.
Diante do tratado no acordo, o prefeito pagaria o que deve aos professores da seguinte forma:
– 30 de outubro: Pagamento integral do salário do mês de outubro
– 10 de novembro: pagamento de 1/3 do salário de agosto
– 20 de novembro: pagamento de mais 1/3 do salário de agosto
– 30 de novembro: pagamento integral do salário de novembro e do último 1/3 do salário de agosto
– 10 de dezembro: pagamento de 1/3 do salário de setembro
– 20 de dezembro: pagamento de mais 1/3 do salário de setembro e pagamento do 13º salário
– 30 de dezembro: pagamento do salário de dezembro e do último 1/3 do salário de setembro
“Só tivemos conhecimento deste acordo entre prefeitura e Ministério Público após o mesmo ter sido feito. O SINTESE não foi chamado para debater ou apresentar uma proposta. Embora a Secretária de Controle Interno do município tenha garantiu segurança orçamentária para cumprir com o acordo firmado com o Ministério Público, ficamos realmente sem saber se de fato tal acordo será cumprido. Tememos que o prefeito Lila Fraga termine seu mandato e não pague os salário de dezembro e o 13º salário aos professores. Por isso, a necessidade urgente do julgamento favorável deste mandado de segurança impetrado pelo SINTESE para que seja de fato assegurado que o prefeito garanta o pagamento de nossos salários, sem atraso, mediante multa caso não cumpra com o estabelecido”, avalia o professor Benizário Júnior.
Recurso tem e excesso de contratos e cargos comissionados também
É importante destacar que, embora o prefeito Lila Fraga coloque a culpa do constante atraso e retenção dos salários dos professores na crise, a prefeitura de Lagarto recebe de FUNDEB e MDE recursos mais que suficientes para arcar com a folha de pagamento do magistério. O real problema está no excesso de contratos e de cargos comissionados. Ao todo a prefeitura de Lagarto mantém hoje em seu quadro mais de 600 funcionários entre contratados e cargos comissionados.
Somente a Secretária Municipal de Educação de Lagarto possui 2 mil funcionários entre efetivos, contratos e comissionados. A relação professor/aluno é de 7,5 estudantes para um professor. O Ministério da Educação (MEC) indica que esta relação seja de 25 estudantes para cada professor.
Vale também destacar que dos servidores públicos de Lagarto apenas os professores estão hoje vivendo a humilhante situação de não pagamento de salário.
“O município possui recurso, mas o que falta é vontade política por parte do prefeito. O uso indevido das verbas que devem ser destinadas a educação, como é o caso da MDE, o excesso de contratos e cargos de confiança só fazem agravar a situação crítica que se encontra a vida financeira dos professores. Não é justo pagarmos pela má administração da gestão municipal. Por qualquer que seja o motivo nenhum prefeito tem o direito de atrasar ou reter salário de trabalhadores, isso é crime! E a justiça tem que tratar como tal e não naturalizar a situação”, enfatiza o professor Benizário Júnior
Relatos de uma realidade cruel
Vários professores de Lagarto possuem apenas vinculo empregatício com a prefeitura do município, ou seja, toda a sua renda financeira vem do salário que recebem como professores da rede municipal. Sem salários há 78 dias muitos estão passando por privações e humilhações que nunca imaginaram. Veja abaixo alguns depoimentos sobre esta triste situação:
“A situação está muito triste e difícil. Muitos de nós estamos até tendo que ficar separados de nossas famílias: coloca um filho para casa de uma tia, o outo filho para casa de outra, esposa para casa da mãe…somente assim conseguimos assegurar alimentação e o mínimo de conforto para todos”, conta o professor Edson de Souza.
“Sou divorciada há nove anos e após o meu divorcio nunca precisei de ajuda de ninguém para me sustentar, mas hoje só estou me alimentando porque meus filhos, que já são adultos, casados, estão comprando comida para mim, estão me dando dinheiro para pagar luz e água. Muitas vezes sento sozinha e choro porque me sinto sem dignidade. O prefeito Lila Fraga retirou a minha dignidade… eu quero a minha dignidade de volta. o que estamos vivendo é o terror. São quase três meses sem salários. Tem muito professor passando fome, tem professor que morava de aluguel e foi despejado, as famílias estão se separando e a justiça nada faz. É muita dor”, desabafa aos prantos a professora Eliane Santana
“Sou mãe e pai, tenho dois filhos, um de 15 anos e outro de quatro anos e os sustento sozinha. Minha família só não esta sem comer porque o SINTESE e a igreja me deram cesta básica. Embora eu tenha uma profissão e trabalhei, eu estou sobrevivendo porque estou recebendo doação de alimentos…veja como isso é absurdo. Fiquei todo este tempo sem água em casa porque não tinha dinheiro para pagar as contas. Estou com dois talhões de luz atrasados, a qualquer momento eles podem cortar minha luz. Isso não é vida, isso é desumano”, narra com tristeza a professora Leopoldina Silva, conhecido como professora Dina.