Mais da metade dos municípios sergipanos atrasam os salários dos professores

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Trinta e nove municípios atrasam salários dos professores. Esse dado faz parte do relatório “Principais Problemas na Gestão da Educação nos Sistemas Municipais de Ensino de Sergipe” que foi divulgado na manhã desta terça-feira, 16, em entrevista coletiva.

A apresentação destes dados foi uma deliberação dos educadores que fazem parte do Fórum em Defesa dos Salários, criado no início do mês de novembro com o objetivo de fazer estudos e buscar soluções para combater o atraso nos pagamento de salários e demais direitos.

Até a conclusão do relatório (15 de dezembro) os professores dos municípios de Aquidabã, Ilha das Flores, Porto da Folha, Riachão do Dantas e Ribeirópolis não tinham recebido os salários referentes ao mês de novembro.

Essa situação somada a péssimas estruturas físicas das unidades escolares e a deficiência qualitativa e quantitativa, falta de material didático-pedagógico, de valorização do magistério (e demais servidores da Educação) e de gerenciamento das escolas monta um cenário extremamente preocupante para a Educação nas redes municipais sergipanas.

Não pagar salário é crime

A Constituição Federal no inciso X, art. 7º é clara ao dizer que o não pagamento dos salários é considerado crime doloso, ou seja, um crime intencional.

“Os professores destes municípios estão às vésperas do Natal e não têm com o que pagar as suas contas mensais e nesse cenário sem a perspectiva de receberem o décimo terceiro e o salário de novembro”, aponta a presidenta do SINTESE, Ângela Maria de Melo.

Vale ressaltar que para o SINTESE, os salários devem ser pagos dentro do mês trabalhado, a regra do “até o quinto dia útil” é aplicada aos trabalhadores que têm o regime de trabalho regido pela CLT – Consolidação das Leis do Trabalho, até pelo fato de que os recursos que devem ser utilizados para o pagamento dos salários dos professores é depositado nas contas das prefeituras dentro do mês.

Direitos Negados

E os educadores não têm problemas somente com atraso no pagamento de salários, mas também de direitos conquistados como: triênio, férias, passivos trabalhistas, décimo terceiro entre outros.

Chegando a situações que beiram o surrealismo, como é o caso de Carira. Os professores deste município não recebem as férias (terço e sexto ferial) desde o ano de 2002. Há salários atrasados referentes aos anos de 2011 e 2012. Até o momento a dívida soma R$6 milhões. Em Aquidabã o município deve ao magistério algo em torno de R$10 milhões.

Não houve queda de receita

Os gestores e gestoras municipais apresentam o mesmo discurso no que diz respeito ao atraso dos salários dos educadores, e em alguns casos, de todos os servidores municipais. A falta de recursos que foi gerada, segundo eles, pela queda de receita.

Tal argumento não é comprovado. Informações que constam nos sítios da Secretaria do Tesouro Nacional, Banco do Brasil, Tribunal de Contas mostram que houve nos municípios, isso sim, um crescimento da receita do FUNDEB – Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação em uma média de 10% (comparando os anos de 2013 e 2014).

O que aconteceu é o que pode ser chamado de uma “frustração de receitas”. Os municípios esperaram ter uma receita maior e essa expectativa não foi atendida, mas nenhum indicador mostra que houve queda nos recursos destinados a Educação.

Se não há queda na receita, quais as principais causas do estrangulamento das folhas de pagamento da Educação nos municípios sergipanos?

De acordo com os estudos feitos pelo Fórum em Defesa dos Salários os principais problemas são:

  • Apadrinhamentos políticos que beneficiam servidores que não trabalham, mas recebem pelas folhas de pagamento das fontes FUNDEB e MDE;
  • Professores em desvio de função em atividades alheias ao ensino e ao efetivo exercício do Profissional do Magistério, mas que continuam recebendo ilegalmente pelo FUNDEB ou MDE;
  • Crescente quantitativo de professores remanejados de função, afastados de sala de aula e substituídos por contratados;
  • Grande quantidade de professores e professoras com idade para requererem aposentadoria continuam na ativa em função do fator previdenciário, das fraudes nas Guia de Recolhimento do FGTS e Informações à Previdência Social e ilegalidades no Cadastro Nacional de Informações Socais/Previdência;
  • Clientelismo político em ano eleitoral resultou em grande número de contratos temporários pagos pelas folhas da educação;
  • Baixíssima relação Professor/Aluno em quase todos os municípios;
  • Inexistência de planejamento dos sistemas municipais de educação implica dentre outros problemas na existência de carga horária de trabalho ociosa.

Distorções e irregularidades

Além das questões citadas, também foram constatadas uma série de irregularidades nas folhas de pagamento dos municípios. Há casos, como o do município de Salgado que no período de janeiro a julho de 2014 foram encontrados pagamentos irregulares que ultrapassam o patamar de R$500 mil.

Negação do direito a Educação

Outro dado que tem preocupado a direção do SINTESE é a constante queda na matrícula nas cidades. Vale lembrar que os municípios tem a responsabilidade constitucional de prover Creches e Educação Infantil e tem a responsabilidade compartilhada com o Estado de garantir o acesso e a permanência de crianças e adolescentes no Ensino Fundamental.

Os estudos (utilizando dados do INEP) mostram que no período de 2008 e 2014 a matrícula caiu uma média de 10,38% nos municípios. Em uma conjuntura em que houve crescimento populacional e que esses alunos não foram para rede estadual ou particular. No cenário em que os recursos são garantidos através do número de alunos matriculados, essa queda gera preocupação.

Os prefeitos e prefeitas vêm negando o direito das crianças a uma escola, pois não utilizam o mecanismo da chamada pública (inclusive o SINTESE enviou oficialmente para todas as prefeituras documentação detalhando todo o processo de realização).

E mesmo com toda falta de responsabilidade com a educação por parte dos gestores públicos e a queda na matrícula desde 2008 (ano em que a lei do piso foi assinada) que os recursos do FUNDEB apresentam sempre numa linha de crescimento.

A presidenta lembrou que em 2012 o piso do magistério teve um reajuste de 22,22%, a maioria das prefeituras negociou e não houve tantos atrasos no pagamento de salários de direitos, por isso atualmente não se justifica atraso de salário, a desvalorização, a discriminação do magistério público.

Descumprimento da Constituição

Outro dado preocupante apresentado na coletiva é que 38municípios aplicaram (em 2013) menos de 25% na Educação. A Constituição Federal estabelece que no mínimo 25% dos recursos devem ser aplicados na educação pública, mas nos dados disponibilizados no sítio do Tribunal de Contas de Sergipe fica claro que mais da metade dos municípios sergipanos descumprem preceitos constitucionais.

A resolução 243/2007 do Tribunal de Contas de Sergipe que estabelece as normas de controle da aplicação dos recursos do FUNDEB prevê sanções administrativas, civis e/ou penais pelo descumprimento do artigo 212 da Constituição Federal e da lei do Fundeb (11.494/2007)

“Temos uma resolução do TCE avançada, mas não que não consegue colocar os mecanismos de fiscalização e punição em prática. Os gestores não são punidos quando atrasam salários ou quando não cumprem os preceitos constitucionais”, ressaltou a presidenta.

Mas em contrapartida existe a criminalização do professor e da professora, que no seu ato de revolta por não poder pagar contas ou não conseguir dar aos seus filhos o que eles pedem. Quando os professores decidem por paralisações ou greves elas são decretadas ilegais, mesmo que a situação dos educadores esteja muito grave.

Para a direção do SINTESE chega a ser constrangedor ter que distribuir cestas de alimentos para educadores (como aconteceu em São Cristóvão, Carira e Umbaúba)  que, pela irresponsabilidade de gestores, estavam sem ter com que se alimentar, pois o dinheiro que deveria ser gasto no pagamento dos salários é utilizado para outros fins.

Para a direção do sindicato há um cenário de caos, mas esse caos é programado. Servidores sem pagamento em dia é fruto de administrações que não se organizam que contratam empresas para gerenciar os municípios, e com isso evidenciam o descaso com que são tratados o serviço e o servidor público.

O relatório será encaminhado para os órgãos fiscalizadores (Ministério Público, Tribunal de Constas de Sergipe, Tribunal de Contas da União, Ministério da Educação) e a expectativa do sindicato é que sejam tomadas providências o mais rapidamente possível para reverter essa situação.