Cine Bijou vive

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Uma sala pequena, com pouco mais de 100 poltronas de couro vermelho, número 174 da Praça Franklin Roosevelt, no centro da cidade de São Paulo. Ali foi inaugurado, no início dos anos 1960, o Cine Bijou, espaço que exibia os chamados “filmes de arte”, alternativos à hegemônica indústria hollywoodiana e que compunha o cenário efervescente da cultura alternativa da Roosevelt, na contramão dos repressivos anos de chumbo. Nos anos 1970, o Bijou expandiu-se, criando ao lado, no número 184, sua segunda sala de exibição, batizada com o nome do ator Sérgio Cardoso, fundador (junto com sua mulher Nydia Lícia) da companhia teatral O Teatro dos Doze e que havia morrido há pouco tempo. O Cine Bijou durou até 1995, quando, junto com a deterioração da Praça Roosevelt, fechou suas portas.

Passados 15 anos, um projeto de resgate histórico desenvolvido pelo Núcleo de Preservação da Memória Política (NPMP) – formado por militantes, ex-presos e perseguidos políticos no período da ditadura – em parceria com o Sarau Quilombo Cidade de Ademar e o Teatro Studio
184, que ocupa hoje a antiga sala Sérgio Cardoso, traz à vida o antigo Cine Bijou, exibindo filmes gratuitamente de 15 em 15 dias, aos sábados, às 15 horas, sempre acompanhados de uma intervenção cênica e um debate com convidados, constituindo o projeto Cine Bijou – Memória e Resistência.

Danilo Dara, historiador e filho de ex-militantes da Libelu (Liberdade e Luta, organização estudantil que lutou contra a ditadura militar), que sempre ouviu nostalgicamente seus pais falarem dos tempos em que frequentavam o Cine Bijou, hoje é um dos idealizadores desse projeto de reativação. Ele conta que a ideia nasceu “do intercâmbio de experiências, de concepções políticas e históricas entre militantes com mais tempo de caminhada e nós, mais jovens”. Dara explica que “esta ponte entre jovens militantes e lutadores de outros invernos, bem como a ponte entre a experiência de resistir à ditadura (nos anos 1960, 1970) e a experiência de resistir à violência da democracia, sobretudo nas periferias (dos anos 2000), estão no cerne do projeto”.

Antropofagia periférica

Para ele, além de assistir filmes de qualidade e boas apresentações artísticas, os objetivos desse projeto abarcam a ideia de “reforçar as discussões críticas sobre a ditadura civil-militar brasileira e todo o seu aparato sobrevivente, sempre a atualizando; intervir num importante espaço da cidade, na contramão da gentrificação e da suposta ‘revitalização’ do centro de São Paulo que tem buscado expulsar trabalhadores desta área – ao contrário, valorizando os trabalhadores que moram na região central ou que a frequentam oriundos das periferias”. Danilo considera que até agora a sessão mais interessante do ano foi a que com o tema “antropofagia periférica” contou com a participação dos mestres da Cooperifa, um dos saraus mais reconhecidos da zona sul de São Paulo.

O jornalista, integrante do NPMP e ex-preso político Alípio Freire conta que o projeto de reativação do Cine Bijou foi pensado a partir do momento, no início desse ano, em que o Núcleo de Memória optou por diversificar mais as suas atividades. A socialista Dulce Muniz, coordenadora do Teatro Studio 184 e amiga de Alípio desde a juventude, aceitou a ideia de imediato e conseguindo um edital da Secretaria de Cultura do Município de São Paulo, juntaram verba suficiente para começar o trabalho.

Entendendo que memória sem presente e futuro é apenas nostalgia ou narcisismo, Freire ressalta a importância da presença de jovens para tocarem o projeto. “Se a nossa ideia é passar a experiência do Bijou para as novas gerações, é indispensável que essas novas gerações já participem desde o início enquanto sujeito do projeto que se implanta”.

 

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