Saravá, embaixador

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Que belo Embaixador do Brasil não teria sido o diplomata, advogado, poeta, crítico de cinema, compositor, músico e cronista Vinícius de Moraes?

De imenso prestígio no exterior já nos anos 60, no entanto, foi cassado pelo regime ditatorial civil-militar que assolou o país, em 1968, quando fazia um show com Nara Leão e Chico Buarque, em Lisboa, e, depois, exilado. Afável, amável, amigável, sereno, educado, mas sem maneirismos. Profundo conhecedor intuitivo da alma humana. Qualidades essenciais para um grande negociador que nunca usou os punhos de renda dos colegas da época.

O que diria Vinícius, ao lado do seu “cachorro engarrafado” como gostava de chamar o copo curto de uísque que o acompanhou a vida toda, o que diria, na tarde de primavera hoje, quando faria 100 anos? Um mundo “danadinho”, um mundo “taradinho” como se referia ao Rio de Janeiro, cidade que foi a sua casa (nasceu no bairro da Gávea), com tamanho amor, em uma das suas crônicas publicadas em jornais cariocas – o excelente Diário Carioca e a Ultima Hora de Samuel Wainer entre outros?

Muitos amores, muitas mulheres, ele sempre caminhou – procurando? – em busca do amor “eterno”. Amores definitivos enquanto duraram. Beatriz (Tati), Lila, Maria Lucia, Regina, Nelita, Gesse, Marta, Cristina, Gilda. E mais mulheres: as filhas. Suzana, uma das moças mais bonitas da sua geração; Georgiana e Luciana, e Maria. O filho Pedrinho, fotógrafo talentoso, nos anos 80 morava em uma casa em cima de uma árvore, em Porto Seguro. Talvez para se resguardar de tantas moças.

O que Vinícius procurou nas moças? Inteligência, beleza, juventude, a proteção materna, o extremo carinho que recebeu das irmãs? Na apresentação do volumePara uma menina com uma flor, dedicado a Nelita que viria ser sua mulher – menina que fugiu de casa para casar com Vinícius deixando o pai Oswaldo enlouquecido; e anos depois todos se tornaram amigos -, na edição da José Olympio de 1966, o cronista comenta “as calamidades públicas da presente conjuntura” se referindo à ditadura.

No mesmo livro, na crônica Depois da Guerra, de 1944, Vinícius produz um texto equivalente ao Ai de ti, Copacabana, que se tornou objeto clássico de estudo do seu grande amigo Rubem Braga. “Ah, quem me dera que essa Guerra logo acabe e os homens criem juízo e aprendam a viver a vida.”

Vinícius partiu quando tomava um banho de banheira, daquelas grandes e antigas, como tinha na sua casa da Gávea, onde adorava relaxar.

Os homens não criaram juízo nem aprenderam a viver a vida depois da Segunda Guerra Mundial como aconselhou e desejou o poeta. O que diria Vinícius, hoje, com todos os carinhosos diminutivos que gostava de usar, de um mundo cada vez mais brutal, com guerras pipocando a cada pretexto?

Talvez Vinícius saudasse a chegada desta primavera como fez na sua crônica Sentido da Primavera na qual descreve: “Dentro da Primavera senti um cheiro mágico de Paz.” Oxalá, Vinícius de Moraes. Saravá.