O presidente da CUT/SE, professor Rubens Marques, e o militante Carlos Alberto do Centro Dom José Brandão de Castro, abordaram o eixo ‘Memória, Verdade e Justiça’, no Grupo de Trabalho da 3ª Conferência Estadual de Direitos Humanos, realizada em Aracaju nos dias 9 e 10 de março. Além das propostas de encaminhamento, o Grupo de Trabalho propôs uma Moção de Repúdio ao deputado estadual Capitão Samuel que tem defendido publicamente a volta da Ditadura Militar.
Membro da Comissão Nacional de Memória, Justiça e Verdade por 2 anos e 7 meses, o professor Rubens Marques acompanhou relatos, teve acesso a documentos e informações sobre lideranças sindicais desaparecidas durante a Ditadura Civil Militar. O resultado foi um relatório de 4.500 páginas apontando para 434 sindicalistas mortos e desaparecidos. O professor avaliou que os números estão abaixo do que de fato ocorreu e citou um operário de Estância que foi para São Paulo e se engajou na Vanguarda Revolucionária de Palmares, este rapaz foi fuzilado em via pública pela Polícia Militar e sepultado como indigente em São Paulo, sendo exemplo de um dos militantes políticos desaparecidos que não consta no relatório.
Professor de História, Marques garantiu que muita informação sobre a Ditadura Militar permanece obscura. “Ninguém divulga que 6.591 militares se rebelaram contra a Ditadura Civil Militar, sendo 3.340 da Aeronáutica, 237 de Policias Estaduais e 2.214 da Marinha. O assunto ainda é tabu porque mexe com um grupo de poderosos que instauraram a Ditadura ou apoiaram e ainda permanecem em postos importantes da atual estrutura de poder. Se hoje temos uma polícia violenta e nas prisões a tortura é regra, não é exceção, é porque herdamos esta cultura de consentir a violência desde a Ditadura quando tudo era permitido a policia: espancar, torturar, estuprar, matar. Os presos eram obrigados a assinarem documentos coagidos sob tortura, confessar crimes que não cometeram. Presos torturados é uma realidade que continua acontecendo”.
Rubens Marques apontou que a cultura da violência e tortura praticada deliberadamente pelo Estado está mais viva do que nunca. “Isso é também consequência da manobra política que concedeu anistia aos torturadores. No Chile, na Argentina, na Alemanha nazista os torturadores foram punidos. Como isso não aconteceu no Brasil, ainda presenciamos Coronéis aposentados ocupando espaços na mídia para fazer chacota com os presos políticos covardemente espancados e torturados. Como se não bastasse, ainda temos uma infinidade de programas de notícia ‘policialesca’ reforçando esta cultura com o discurso de que ‘Direitos Humanos é pra bandido’. Um debate completamente invertido. Então não é por acaso que parte da população brasileira quer a extinção dos pobres através da redução da maioridade penal”.
O presidente da CUT/SE acompanhou todas as oitivas da Comissão Estadual da Verdade em Sergipe, elogiou a iniciativa, mesmo que um pouco tardia, e sugeriu que fossem convidados a prestar seus relatos os colaboradores diretos e indiretos com Ditadura Militar no Estado de Sergipe.
Em sua exposição, Carlos Alberto Santos, do Centro Dom José Brandão de Castro, alertou para a Ditadura que acabou e a Ditadura que persiste. Santos relatou sua experiência pessoal como sobrevivente de uma entre várias tentativas de assassinato de lideranças da reforma agrária na década de 80, período de transição para a redemocratização. Ele destacou a importância de Dom José Brandão de Castro na região do Baixo São Francisco na luta pela reforma agrária, assim como a necessária atuação de vários padres corajosos e bispos influenciados pela Teologia da Libertação. Carlos Alberto também questionou o papel do Judiciário na criminalização dos movimentos sociais e sindicais, sua conivência com a perseguição e prisão de lideranças dos movimentos sociais, alertando que é a ordem judicial que determina a prisão executada pela Polícia.
Após explanação, quatro propostas foram elaboradas pelo Grupo de Trabalho que serão encaminhadas para a 12ª Conferência Nacional de Direitos Humanos que acontece em Brasília no mês de abril:
1) Revisão da Lei de Anistia: levando em consideração que Tortura é um crime de lesa humanidade, portanto, imprescritível. A proposta do GT é de que os torturadores sejam punidos através de uma revisão da Lei de Anistia.
2) Criação de uma Lei Nacional para retirada do nome de torturadores das escolas, praças e logradores públicos; além de concomitante campanha publicitária para informar a população quem foram os Ditadores e por quais crimes eles são responsáveis.
3) Criação de Memoriais, Nacional e Estaduais, de livre acesso e visitação ao público que reúna toda a documentação, instrumentos de torturas, fotografias, vídeos, resumo biográfico de lideranças, vítimas, torturadores, mandantes; assim como o tombamento das instalações e prédios públicos onde aconteciam as torturas, prisões e assassinatos.
4) Exposição Permanente e Itinerante nas escolas, a partir do acervo dos Memoriais Estaduais e Nacional.