Eleição em Berlim: o Partido Pirata saqueia os outros

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Eles eram um bando de jovens, tidos como imaturos politicamente, divertido, e só. Mas não são mais vistos assim.

São os membros do Partido Pirata, que vem crescendo nas intenções de voto para as eleições em Berlim, domingo próximo, 18/09.

O Partido Pirata atua em nível internacional. Em 2008 entrevistei para este blog a jovem estudante Amelia Andersdotter, do Pirata sueco, que acabara de se tornar a candidata n* 2 do partido para tomar posse no Parlamento Europeu. Em 2009, com a reforma do Tratado de Lisboa, que aumentou o número de deputados nesse Parlamento continental, ela se tornou de fato elegível para ocupar a segunda cadeira a que o PP sueco passou a ter direito.

Com 24 anos recém feitos (30 de agosto) ela seria uma das deputadas mais jovens da história desse parlamento, senão a mais jovem.   Naquela entrevista Amelia qualificou a ação do partido como de fato monotemática. Perguntada sobre outras bandeiras ou porpostas do partido, que não fossem as ligadas à absoluta liberdade de expressão e apropriação intelectual na internet (daí o nome do partido) , ela declarou que ele tinha eleitores à direita, à esquerda, ao centro, etc., e que se avançassem em qualquer direção, poderiam perder votos.

A idéia soava bastante razoável. Entretanto, na futura eleição berlinense a história parece estar sendo outra.

O Partido Pirata de Berlim avançou, abriu seu leque de propostas, e foi mais para a esquerda. Incorporou bandeiras como a de um salário mínimo, que não existe na Alemanha, e é cavalo de batalha do movimento sindical. Até agora somente a Linke, A Esquerda, tinha abraçado essa bandeira. Fazendo uma campanha bem humorada e consistente, o Partido Pirata aparentemente vem roubando votos de todos os partidos.

Lançou, por exemplo, a campanha de que se privatizem… as religiões! É uma contraposição ao fato de que as igrejas alemãs podem cobrar impostos de seus adeptos. Também tematiza a sua própria fragilidade: um cartaz perto de minha casa diz, ao lado da foto do candidato: “o que eu estou fazendo pendurado aqui, se vocês não vão mesmo votar em mim”? Isso atrai votos, naturalmente…

Outra interpretação possível é a de que com essa campanha o Partido vem atraindo votantes que antes se desinteressavam pelas eleições (o voto é facultativo), numa época de baixos comparecimentos às urnas. Na recente eleição na província de Mecklenburg-Vonpommern, terra natal da chanceler Angela Merkel, na antiga Alemanha Oriental, o comparecimento foi de 51%, considerado não-representativo. No último fim-de-semana houve eleições para as 37 cidades da província de Brandemburgo, que fica ao redor de Berlim. O comparecimento médio foi de apenas 46%, havendo cidades onde chegou aos 30%.

Partido Pirata aposta em campanha bem humorada (Foto: Flavio Aguiar)Nas pesquisas, todos os partidos estão perdendo. O Partido Social Democrata (cujo prefeito, Klaus Wowereit, deve se manter no cargo), o SPD, tem atualmente 36 % das cadeiras no Parlamento local (Berlim é uma cidade-estado, assim como Bremen e Hamburgo). Aparece com 32 % das intenções. A União Democrata-Cristã (CDU), da chanceler, deve cair de 24 para 21%. A Linke, de 15 para 11%. Os Verdes devem crescer de 16 para 19%, mas ainda assim enfrentam um sentimento de “perda”, porque antes o partido chegara a um patamar superior a 25%, apresentando candidata própria à prefeitura (Renate Künste). Mas com uma campanha não muito criativa, a queda foi inevitável, além de que sua movimentação à direita, para se diferenciar da Linke e do SPD pode ter cobrado seu preço também.

O FDP (Partido Liberal Democrata), descrito sempre como de “meia-direita”, ou como o “business friend”, uma espécie de DEM sem história coronelista, hoje correligionário da coligação no governo (com a CDU e a CSU, da Baviera), pode ser varrido do Parlamento berlinense, caindo de 7,5 para 4%, pois um partido deve ter pelo menos 5% dos votos para ter acesso ao Legislativo.

Enquanto isso, os Piratas, cuja votação ficava aquém dos 3%, já estão com 5,5% das intenções de voto, num crescendo que pode não parar por aí. Assim, pela primeira vez, eles teriam cadeiras num parlamento alemão (umas 3 ou 4 valiosíssimas cadeiras em cerca de 150). Não só isso.

Como Berlim é uma cidade à esquerda na Alemanha, ela tem hoje uma das únicas coligações entre o SPD e a LInke no país. Normalmente o SPD não aceita a Linke, porque vê esse partido como “herdeiro do comunismo”, ou ainda(e também) como formado, em parte, por “traidores dissidentes” seus. Os Verdes também não aceitam normalmente a Linke, partidários que são, cada vez mais, de um “biocapitalismo”.

Não sabe ainda como ficará a situação, depois do 18 de setembro. Vai depender do desempenho da Linke, da vontade dos Verdes de se reaproximar do SPD, deste aceitar essa reaproximação ou manter a aliança com a Linke, e também do fato de que tudo pode ainda mudar até a eleição. Por exemplo: como o voto é facultativo, um dia muito ensolarado (ainda mais em fim de verão) pode mudar o percentual de comparecimento especialmente dos mais jovens. Já um dia chuvoso e frio diminui o comparecimento dos mais idosos…

Mas nesse quadro semovente da política berlinense, a participação dos Piratas num governo de coalizão mais à esquerda não é mais um blefe ou um sonho impossível.