Sempre quando ocorrem catástrofes nas quais vidas humanas são perdidas, como a que ocorreu no Rio de Janeiro neste início de ano, costumamos expressar a nossa solidariedade, ou questionar as ações do Poder Público que não age preventivamente, ou fazemos as duas coisas.
Entristecemo-nos e nos indignamos passageiramente – até surgir um novo fato para o qual a mídia conduza a nossa atenção: a contratação de um grande craque pelo nosso time de futebol preferido; a “fenomenal” disputa no BBB; o luxo e a grandiosidade das escolas de samba do Rio e de São Paulo, ou outra banalidade qualquer. A nossa consciência crítica não permanece alerta por mais do que 15 dias, o tempo suficiente para deixarmos de nos emocionar e para cansarmos de ver na televisão as cenas dos dramas, inda há pouco, vivenciados.
Pior, a nossa solidariedade sofre de hipermetropia (não consegue ver claramente as coisas próximas) – quando não de astigmatismo. Não enxergamos, ou fingimos não enxergar, que na nossa cidade, na cidade vizinha, no nosso bairro e no bairro vizinho, seres humanos estão submetidos a condições de alto risco e não estamos nem aí para eles.
Cobramos do Estado que banque a apresentação daquele cantor caríssimo, que está fazendo o maior sucesso na Globo, durante a festa da nossa cidade. Revoltamo-nos quando não o faz, mas somos incapazes de mover “uma palha” para garantir o cumprimento de direitos sociais consagrados ainda na Declaração Universal dos Direitos Humanos, editada em 1948 e repetidos pelo art. 6º da Constituição Federal: o direito à moradia e o direito a condições dignas de vida. Para quê? Eu já os tenho! Além do mais, poderei, de quando em quando, fazer um ato de caridade. Exercitarei a minha hipocrisia religiosa e, quem sabe, até, conquistarei um lugar no céu.
O “Desastre da Serra” precisa servir para essa boa causa: sairmos desse estado de letargia e apatia em que nos encontramos atualmente; revivermos momentos em que a sociedade se mobilizou para a solidariedade verdadeira, duradoura, aquela que transforma.
Foi em um desses instantes que construímos, com luta, a atual Constituição, a qual, pela nossa desmobilização vem sendo violentamente agredida, mas que nos apontou caminhos para mudanças, muitas vezes abandonados por nós mesmos.
Para que isso ocorra – embora não seja esse o único meio – é essencial que os educadores se apercebam da sua real importância (não aquela cansativa e maquinalmente repetida para delírio das plateias de professores). É preciso que compreendam o sentido e a extensão do disposto no art. 205 da Constituição Federal, que assim está redigido:
Art. 205 – A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.
Cada professor, ao ministrar qualquer dos componentes curriculares, faça do seu mister um instrumento permanente de mobilização, a fim de que a Educação possa colocar em prática a vontade das Nações expressada no art. XXVI, item 2 da Declaração Universal dos Direito Humanos:
2. A instrução será orientada no sentido do pleno desenvolvimento da personalidade humana e do fortalecimento do respeito pelos direitos humanos e pelas liberdades fundamentais.
Quiçá com a nossa própria disposição e com o auxílio primordial dos nossos educadores, consigamos não mais chorarmos tantas mortes.