Saúde do Trabalhador no Governo Dilma
À Excelentíssima Presidente da República
Dilma Roussef
Somos pessoas que desde o primeiro turno das eleições presidenciais fizeram a opção por sua candidatura ou que por ela optaram no segundo turno, ou ainda, pessoas que ajudaram ativamente na sua construção.
Qualquer palavra sobre a esperança que sua eleição nos traz seria redundante e apequenaria o que gostaríamos de tratar nesta carta em breves linhas, que temos certeza, atingirão o nosso objetivo que é o de chamar a sua atenção sobre a saúde dos trabalhadores deste país.
Compreendemos e apoiamos o grande esforço feito pelo governo Lula na busca do crescimento econômico e ao mesmo tempo da distribuição de renda, marco da gestão federal dos últimos 8 anos.
No entanto, no que tange a saúde dos trabalhadores, temos testemunhado e estudado o grande impacto desse processo produtivo sobre a saúde dos que trabalham, seja em forma de acidentes seja em forma das diversas manifestações de adoecimento. Continuamos a ter mortes e mutilações decorrentes de acidentes traumáticos como quedas de altura, amputações, sufocamento por grãos, explosões, dentre outras causas, eventos que não ocorreriam se a mesma atenção dada à economia fosse dispensada às questões de segurança e saúde do trabalhador.
São processos de trabalho que deveriam tornar-se cada vez mais seguros por meio de dispositivos de proteção coletiva, que não pudessem ser “desmontados” para o aumento do ritmo de trabalho em nome da produtividade. Concomitantemente a esses acontecimentos chamados acidentes, lembrando que de acidentes só têm o nome, pois são perfeitamente previsíveis e evitáveis, há um processo de adoecimento que se mistura àquele esperado para a população em geral e que só seria perceptível aos olhos dos governantes se houvesse uma política de Estado com base em dados reais captados por sistemas à prova de interesses que não os públicos.
Qual governante poderia relacionar alguns processos cancerígenos à exposição de substâncias químicas em passado remoto? Dizem os empresários, devidamente amparados por seus técnicos, médicos, peritos e mídia, que a solução passa pela proteção do trabalhador com o uso de equipamentos individuais, sem pensar na necessidade de pesquisas para substituição dessas substâncias ou o seu uso em processo totalmente fechado que não coloque o trabalhador ou o meio ambiente em contato com a substância. Tampouco se pensa no descarte dos produtos que sobram desses processos, preferindo fazê-lo de forma irresponsável, contaminando trabalhadores, pessoas da população e o meio ambiente de forma irreversível.
Qual governante poderia relacionar legiões de pessoas com dores músculo-esqueléticas, particularmente de coluna e de membros superiores às exigências no trabalho, nem sempre relacionadas somente ao esforço físico, mas também aos movimentos repetitivos, à pressão para produção, à ausência de pausas e à falta de tempo para recuperação? Em resposta ao grande contingente de mulheres jovens incapacitadas por lesões múltiplas músculo-esqueléticas, dizem os empresários, devidamente amparados por seus técnicos, médicos, peritos e mídia, que essas formas de adoecimento são decorrentes da sobrecarga que determinados afazeres domésticos impõem e que os caminhos são os da seleção de pessoal para as atividades de trabalho. Calam-se diante dos trabalhadores do sexo masculino com problemas semelhantes e tecnocratas calculam riscos de custos previdenciários e maneiras de “corrigir” as planilhas.
Seria importante perguntar aos profissionais de saúde pública e aos professores de fato dedicados à ciência e ao ensino qual é a estimativa de tempo de vida laboral sem adoecimento que se dá para os coletores de lixo que correm atrás dos caminhões, recolhendo sacos de lixo e jogando-os para os veículos. Não se pensa em políticas integradas em que a população colocaria os lixos de forma seletiva em determinados dias da semana para diminuir o lixo de cada dia, para facilitar a reciclagem e ao mesmo tempo diminuir a carga de trabalho dos coletores. Tampouco se pensa em mudar a forma de coleta de lixo e de compatibilizar o número de trabalhadores com a demanda da população. Isso seria muito caro para os empresários. Até o momento tem sido caro para os trabalhadores e suas famílias.
Qual governante poderia relacionar o grande contingente de pessoas com depressão, alcoolismo e outros transtornos mentais com a pressão para o alcance das metas estipuladas pelas empresas para um cada vez mais reduzido quadro de pessoal? Dizem os empresários, devidamente amparados por seus técnicos, médicos, peritos e mídia, que essas formas de adoecimento são decorrentes da modernidade e da violência urbana que preocupa a população em geral e que os caminhos são novamente os da seleção de pessoal, por meio de teste psicológicos para identificar os mais resilientes. Em nenhum momento se pensa efetivamente em mudar o processo de trabalho que estimula a competitividade entre os trabalhadores e que abrem espaços para práticas humilhantes em todos os níveis hierárquicos das corporações. Tudo ocorre com um contingente cada vez mais enxuto em nome das reengenharias e modernizações organizacionais, sem que se discuta a quem esses lucros deveriam favorecer.
O Estado tem ficado com parte dos mortos e feridos desses campos de batalha escondidos; a outra parte tem sido descartada pelo próprio Estado, que tem sido competente em se livrar, deixando-a desassistida e desamparada, sem terapias e sem os chamados benefícios previdenciários. Enxugamos gelo particularmente no SUS e na Previdência Social, cujas máquinas ainda não se dedicam a analisar e a criar mecanismos que contenham essa sangria, como é o caso da Saúde. No INSS, identificamos estruturas internas herdadas dos governos anteriores que trabalham ativamente nos subterrâneos, desconstruindo a legislação por meio de dispositivos normativos que têm boicotado as iniciativas positivas. Sequer sua base nacional de dados é compartilhada com outras pastas governamentais como a Saúde e o Trabalho para que políticas de Estado possam ser construídas.
Senhora Presidente, muito tem se escrito sobre estas questões, mas não se tem conseguido colocar a saúde do trabalhador na pauta do crescimento e desenvolvimento econômico do país. A III Conferência Nacional de Saúde do Trabalhador, convocada pelos Ministérios da Saúde, do Trabalho e Emprego e da Previdência Social, ocorrida em 2005, intitulou-se “Trabalhar sim, adoecer não” e discutiu a intersetorialidade, a transversalidade, o desenvolvimento sustentável e a participação social. À luz de questões levantadas e discutidas naquele processo é preciso construir, junto com a Agricultura, com a Indústria e Comércio, com o Planejamento e demais áreas econômicas, um projeto de sociedade que queremos. Colchas de retalhos que vêm se desenhando em comissões de gabinete já as temos aos montes.
Ao contrário do que dizem alguns, incluir o elemento humano no desenvolvimento sustentável é economicamente vantajoso e acelerará o processo de distribuição de renda e de inclusão social do governo Dilma. Da mesma maneira que o Governo Lula vem promovendo crescimento com redução da desigualdade, achamos que no estágio em que nos encontramos no Brasil, também é momento de combinar crescimento econômico com redução das desigualdades nos ambientes de trabalho, evitando doenças e mortes.
Atenciosamente.
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